Você escreve certo ou escreve bem? Essa pergunta pode soar estranha, mas o fato é que nem sempre um texto correto é
um texto
bem escrito. Para chegar à correção, basta
que se tenha o domínio
das normas de gramática.
Já o bem escrever
pressupõe algo mais.
Depende de consciência linguística. Quem a tem fica menos
ligado nas regras do que no poder comunicativo e no valor
expressivo das palavras.
A consciência linguística está levando, por exemplo, à aposentadoria da mesóclise. Antigamente era
sinal de distinção
encher o texto
de “far-lhe-ei”, “dir-te-ia”, “vê-lo-ás” e construções
semelhantes. Jânio Quadros,
que era
professor de português,
notabilizou-se por empregar
o pronome no meio
do verbo até
em bilhetinhos para
os assessores.
Hoje se prefere dizer “Lhe farei uma visita”
a “Far-lhe-ei uma visita”. A segunda construção soa pernóstica, pouco
natural. A pronúncia
retorcida das construções mesoclíticas não resistiu ao despojamento e ao dinamismo próprios da
nossa época. Escrever bem hoje
é valorizar as formas
breves e simples,
que atingem com
mais eficiência
o leitor.
Não foi apenas
a mesóclise que
se ausentou do cardápio. No plano
semântico, passou-se a valorizar
as palavras de uso
comum. “Propósito”
em vez
de “desiderato”; “destacado”
no lugar de “conscípuo”; “desprezível” preferencialmente
a “despiciendo”.
No domínio da sintaxe, períodos longos
e invertidos deram lugar às orações absolutas e à ordem
direta. Em
vez de “Ontem,
depois de horas
de espera, quando
ninguém mais
achava que o roqueiro
Z aparecesse, ele resolveu sair do hotel e dar autógrafos aos fãs” – prefere-se esta construção
mais e simples e clara: “Ontem o roqueiro
Z resolveu sair do hotel
e dar autógrafos
aos fãs. Isso
depois de horas
de espera, quando
ninguém mais
achava que ele
aparecesse”.
Escrever bem é pensar
no leitor. Não
é justo fazê-lo quebrar
a cabeça com
períodos quilométricos ou palavras
cerebrinas. Por sinal,
acabei de fazer isso
ao usar o termo
“cerebrinas”. O consolo é que ninguém
perde nada indo ao dicionário.
A simplificação da linguagem, própria dos tempos
que correm, não
nos deve levar
a esquecer esse
hábito salutar.
Ótima recomendação!
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